Bênçãos da Unidade

Nelson Salviano

No Evangelho de João, capítulo 17, Jesus está rogando ao Pai em favor da unidade do povo de Deus. Ele quebrou as barreiras entre os homens para que todos pudessem ser salvos. Riqueza, posição social, língua, nacionalidade, etc., são esquecidos em favor da única coisa que importa: a salvação e a vida que Ele oferece. Todas as divisões, diferenças e preconceitos são colocados de lado, e um espírito de amor, paz e unidade permanece. Infelizmente, nem todos os crentes andam no Espírito e, por isso, permitem que coisas pertinentes à velha vida tornem a fazer parte deles, resultando na perda da unidade, fato que tem se constituído num dos maiores obstáculos para o crescimento da Igreja. O escritor Paul Bill Himer faz uma declaração muito forte, porém verdadeira: 

“A falta de unidade é o pecado e a desgraça da Igreja hoje, pois ela tem colocado mais pessoas no inferno do que qualquer outra coisa”. A falta de unidade cria barreiras para a evangelização mundial, impedindo que o Espírito Santo convença com poder o mundo e traga um grande avivamento. Deus está criando novos céus e nova terra onde não haverá outro espírito. Portanto, Ele quer que vivamos no amor e na unidade de Seu Espírito agora (1 Co 1:10; 2 Co 13:11; Ef 4:3; Fp 1:27; 1 Pd 3:8) para que desfrutemos das seguintes bênçãos:

Pertencer ao Corpo de Cristo(…) para que sejam um, como nós o somos; eu neles e tu em mim (…) (Jo 17:21). Muitos cristãos têm permitido que a teimosia, o ciúme, a inveja, a falta de perdão e o orgulho entrem em suas vidas. Convivem com mágoas, ressentimentos, amarguras e relacionamentos quebrados no meio da Igreja, servindo de barreira ao Espírito de Deus e machucando o Corpo de Cristo. Por causa disso, não há crescimento espiritual em suas vidas e não conseguem permanecer firmes na fé. Precisamos uns dos outros, somos partes de um só Corpo, a Família de Deus. “Porque, assim como o corpo é um e tem muitos membros, e todos os membros, sendo muitos, constituem um só corpo, assim também com respeito a Cristo. Porque também o corpo não é um só membro, mas muitos” (1 Co 12:12, 14). Quando nos reunimos (líderes e membros da Igreja), percebemos que cada um tem dons e temperamentos diferentes, cada um tem seu próprio estilo, mas, unidos em Cristo, podemos causar um impacto poderoso neste mundo incrédulo. O Apóstolo Paulo usa um pouco de seu humor quando diz: “Se o pé disser: Porque não sou mão não sou do corpo; nem por isso deixa de ser do corpo. Se o ouvido disser: Porque não sou olho não sou parte do corpo, nem por isso deixa de o ser” (1 Co 12:15, 16). Sabemos que isto é ridículo porque as mãos e os pés fazem parte do nosso corpo. Quando tropeçamos com o dedão do pé em alguma pedra, dói muito, só então nos lembramos de que o dedo faz parte do corpo. Então, mesmo aqueles irmãos que são pouco lembrados na igreja fazem parte do Corpo de Cristo e exercem uma função importante.

Atingir a maturidade espiritual(…) a fim de que sejam aperfeiçoados na unidade (…) (Jo 17:23a). O verbo “aperfeiçoar” significa “levar a ser completo, alcançar, consumar, terminar, preencher”. Quando pensamos nisto em relação às Missões Mundiais, especialmente considerando os povos muçulmano, budista, hindu e outros ainda não alcançados, percebemos que somente cristãos maduros poderão levar o Evangelho àquelas partes do mundo. Penso que o Senhor Jesus está nos dizendo neste versículo que nunca seremos maduros e fortes o bastante até o instante em que sejamos unidos, porque é na unidade que somos aperfeiçoados. Houve um período em minha vida em que eu pensava que poderia atingir sozinho o alvo da perfeição (Ef 4:13). Então, procurava orar, ler a Bíblia e jejuar mais do que os outros irmãos. De repente, Deus começou a ensinar-me que eu não sou o Corpo de Cristo, mas sim um membro dele, e que só unido ao Corpo alcançaria Suas bênçãos. Então aprendi que, se queremos causar impacto com o Evangelho, precisamos viver em unidade e estar conscientes de que, paralela às guerras que acontecem no mundo hoje, há outra guerra sendo travada nas regiões celestiais contra os principados e as potestades; uma batalha espiritual na qual todo crente está envolvido. Todavia, não podemos lutar contra esses principados simplesmente com o nosso intelecto ou com a nossa beleza ou força física; precisamos ser bons soldados de Cristo para usarmos a armadura de Deus (Ef 6:10-20). Por causa da falta de unidade, alguns soldados estão fracos e incapazes de erguer o escudo da fé. Satanás os tem atingido com dardos inflamados: imoralidade, orgulho, falta de coragem, depressão, dúvida etc.; com isto, muitos abandonam o Evangelho e, cedendo às tentações deste mundo, impedem o progresso da obra de Deus. Quando o Corpo está desunido, os soldados ficam fracos e doentes, não podendo erguer o escudo da fé, como são admoestados pelo Apóstolo Paulo (Ef 6:16). Conseqüentemente, não haverá maturidade espiritual nem evangelismo efetivo nem orações fervorosas.

Tornar-se testemunha de Cristo(…) para que sejam um como nós somos um (…) para que o mundo creia que tu me enviaste (Jo 17:22 e 23). Se não somos unidos, o mundo jamais crerá em Cristo. Esse é o maior problema que a Igreja de Jesus enfrenta para alcançar todos os blocos religiosos ainda não alcançados. Os muçulmanos, por exemplo, dizem: “O que os cristãos têm de diferente para nos oferecer? Um livro? Um profeta? Um Deus? Nós também temos um livro, um profeta e um deus.” Então, a diferença terá que ser vista através da nossa unidade, pois isto é o que fala alto a este mundo desunido. Durante o período em que estudei na Inglaterra, eu era membro de uma igreja cosmopolita (Calvary Evangelical Church, em Brighton). Metade dos membros era composta de ingleses; e a outra de suíços, alemães, espanhóis, italianos, chineses, africanos, latinos e asiáticos. Eu me lembro quando um zeloso muçulmano começou a visitar-nos. Depois de um certo tempo, ele se converteu e testemunhou dizendo que havia decidido seguir a Cristo não por causa dos sermões, mas sim por causa da unidade que ele presenciou naquela igreja. A nossa união falou forte ao seu coração. Quem sabe poderíamos ter-lhe dito: “Jesus é o único caminho! Jesus te ama! Jesus te salva!” etc. Embora seja verdade, não tenho certeza se isso teria tocado seu coração, porque ele já ouvira tudo isto antes. Então, ele veio para o nosso meio, viu a nossa união e começou a fazer perguntas: “Como isto é possível? Como vocês conseguem viver unidos?” Assim, tivemos a oportunidade de levá-lo a Cristo.


 

 

PROMESSAS DE DEUS ÀQUELES QUE VIVEM EM UNIDADE

Ao falar sobre unidade, estou pensando nas relações pessoais entre o povo de Deus. Em Mateus 18, o Senhor Jesus menciona duas leis, dentre outras, para mantermos o relacionamento correto uns com os outros (a lei da reconciliação, vv. 15-17 e a lei do perdão perpétuo, vv. 21 e 22) e, entre essas duas leis, Ele nos dá três promessas. Quando percebi isto no texto, fiquei curioso porque não fazia sentido o Senhor interromper o que estava dizendo para falar dessas promessas. Tanto que, se na minha leitura, eu pulasse do verso 17 para o verso 21, parecia haver uma boa continuação do assunto. Todavia, Jesus introduz as duas leis para mostrar que Suas promessas são condicionais e que a condição, neste texto, é ter um relacionamento correto uns com os outros. Vejamos estas promessas:

Autoridade para o Corpo — Em verdade vos digo que tudo que ligardes na Terra, terá sido ligado no Céu, e tudo que desligardes na Terra, terá sido desligado no Céu. (Mt 18:18). Eu creio que Jesus está falando sobre autoridade. Em Mateus 28:18 e 19, Ele disse: “Toda a autoridade me foi dada no Céu e na Terra. Portanto, ide (…).” Jesus nos deu toda a autoridade para ir e fazer a Sua obra, para amarrar o inimigo e desamarrar os obreiros, desamarrar as finanças para o trabalho de Deus, libertar países que são territórios do inimigo. Porém, Satanás, sabendo que temos esta autoridade, tenta nos dividir e nos destruir. Ele sabe que se conseguir entrar na Igreja ou no lar através de relacionamentos quebrados, brigas e amarguras, então não haverá poder entre o povo de Deus. Infelizmente, ele tem feito com que muitos cristãos se dividam em questões sem muita importância, deixando de lado aquelas que são essenciais e, com isso, a autoridade deles tem sido enfraquecida.

 

Resposta às orações coletivas — Em verdade também vos digo que, se dois dentre vós, sobre a Terra, concordarem a respeito de qualquer coisa que porventura pedirem, ser-lhes-á concedida por meu Pai que está nos Céus. (Mt 18:19). A palavra concordar significa “ter harmonia, soar bem juntos”. É como uma orquestra, onde diversos instrumentos emitem sons diferentes, mas quando tocados juntos produzem uma melodia maravilhosa. Não é um barulho estridente aqui e outro estranho lá, mas é um som harmonioso. O Senhor Jesus está dizendo que, quando nos reunimos e concordamos, podemos pedir e será feito. A oração é uma das armas mais eficazes do crente, no entanto, tem sido pouco usada hoje. O que aconteceu com as reuniões de oração? Onde estão as pessoas que se reuniam para um período longo de oração? Será que não cremos mais no poder das orações porque não as vemos funcionar? Se tivermos harmonia, comunhão, unidade, então podemos orar e receber as respostas. Na verdade, quando nos reunimos para orar, não queremos que seja um agrupamento qualquer, queremos ver Deus respondendo nossas orações. Para tanto, teremos que concordar com o que estamos pedindo e ter certeza de que os relacionamentos pessoais estão corretos. Se estamos em Cristo estamos unidos, temos que manter esta unidade!

 

Presença de Deus — Porque onde estiverem dois ou três reunidos em meu nome, ali estou no meio deles. (Mt 18:20). Isto não se refere à aquela hora que nos encontramos para tomar um cafezinho ou até mesmo quando nos reunimos na igreja para adorarmos a Deus, mas é o fato de que, como corpo, estamos unidos e mantendo um relacionamento correto uns com os outros. Isto significa que qualquer pessoa não crente, ao entrar em nossa igreja, perceberá a união, a harmonia e o bom relacionamento entre os irmãos, sentirá o impacto da presença do Deus vivo e decidirá fazer parte do Corpo de Cristo também. O mundo incrédulo precisa ver que há uma diferença entre eles e o povo de Deus, mas isto só é visto quando somos um no Senhor Jesus. Está escrito no livro de Salmos que “Na presença do Senhor há alegria” (Sl 34:6), mas há irmãos pensando que o crente não pode divertir-se ou alegrar-se. Quando lemos sobre a Igreja Primitiva, no livro de Atos (capítulo dois), notamos como os cristãos viviam o dia-a-dia daquela época com alegria e entusiasmo; eles estavam sempre na expectativa de que Deus iria operar e, por isso, o poder divino foi liberado sacudindo o mundo daquela época. Isto também pode acontecer hoje, se estivermos unidos. A Bíblia diz que “a alegria do Senhor é a nossa força” (Ne 8:10), todavia, encontramos pessoas doentes e cansadas — não por causa do excesso de trabalho mas por um cansaço emocional provocado por relacionamentos partidos. A amargura, o ódio e o ressentimento que se alojam no coração da pessoa fazem com que ela saia da presença de Deus, não tenha poder nem alegria. A pessoa não dorme nem se alimenta bem nem consegue manter um bom relacionamento com os outros. Eventualmente, isto provoca dores e doenças físicas que os médicos não conseguem descobrir a razão. Todavia, quando há alguma quebra de relacionamento e logo usamos os princípios de Deus para restaurá-lo, reconciliando-nos com a pessoa ofendida e perdoando-a, então uma tremenda alegria retorna ao nosso coração.

Conclusão — A unidade entre os crentes deve refletir aquela existente entre o Senhor Jesus e o Pai celestial (Jo 17:11, 21-23) — unidade na natureza (2 Pd 1:14), no caráter (1 Pd 1:15 e 16) e no propósito de vida (Mt 20:28; Jo 20:21). É a glória de Deus em nossas vidas que nos une com o Pai e com o Filho e faz que sejamos um com os irmãos (Jo 17:22; 2 Ts 2:14), para ajudar-nos mutuamente a ser e a viver como nova criatura (santa, justa e pura) e a proclamar a gloriosa mensagem de Deus, como embaixadores que oferecem as condições de paz do Evangelho (2 Co 5:20).

Se algum sentimento negativo quebrou nosso relacionamento com alguém, temos que repará-lo rapidamente. Os muitos cismas que aprecem na unidade cristã, através da história da Igreja, são devidos, não tanto a grandes crimes e planos maquiavélicos entre irmãos nem a profundas diferenças de opinião, mas, na maioria dos casos, à falta das simples virtudes básicas à fé cristã, que sustem a unidade de todos, descritas na carta aos Efésios: (…) com toda humildade e mansidão, com paciência, suportando-vos uns aos outros em amor, esforçando-vos diligentemente para preservar a unidade do Espírito no vínculo da paz. (Ef 4:2 e 3). Há muitas idéias estranhas a respeito de humildade: pobreza, pouca ou nenhuma escolaridade, roupas simples, timidez etc. Porém, humildade significa “uma força sob controle”. A palavra que sempre aparece junto com humildade é mansidão. Moisés era um homem manso. Será que ele era um homem fraco? Não. Ele controlava sua força e sua autoridade. Quando foi criticado e traído pelos próprios irmãos, Arão e Miriã (Êx 32; Nm 12:1-16), ele tinha poder para destruí-los, mas controlou sua força. Quando alguém nos ofende e, mais tarde, percebe o mal que nos causou, passamos a ter poder sobre o ofensor. Mas não devemos usar desse poder, e sim perdoar e esquecer a ofensa (Fp 2:3). Paulo nos exorta a ter paciência e a suportar uns aos outros em amor — dar tempo para Deus terminar a obra que Ele começou (Gl 5:13-15, 22 e 23) e também nos esforçar por manter a paz (Sl 34:12-16; Mc 9:50; Rm 12:17 e 18; 14:17; 1 Co 7:15; Cl 3:15; 2 Tm 2:22; Hb 12:14) para que possamos permanecer unidos no Espírito de Deus. É nesta direção que temos de orar e trabalhar, construindo relacionamentos sadios no Corpo de Cristo. Porque juntos, em unidade, alcançaremos o mundo para Cristo!

Nelson Salviano

É ministro do Evangelho, bacharel em Teologia, mestre em Missões e Estudos Transculturais pelo All Nations Christian College (Inglaterra). Especialização em Pregação Expositiva pelo Cornhill Training Center (Londres) e Stephen Olford Centre for Expository Preaching (Memphis, TN, USA).

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